quinta-feira, setembro 11, 2003

O bloco da eu sozinha

Às vezes eu me basto.
Amo gente e acho que as pessoas são a matéria prima da vida. São o que vale nessa existência, além da lua, do pôr-do-sol e outras coisas bregas e indispensáveis. Mas às vezes não preciso delas. Às vezes um papel e uma caneta, um livro, um computador ou um saco de pipoca no cinema são suficientes para a minha felicidade.
Adoro ver um filme sozinha. Adoro sentar e escrever barbaridades sem que ninguém por perto note minha presença. É bom saber que a minha companhia é sempre bem-vinda. Afinal, eu sou uma moça bacana e, tirando alguns momentos de extrema auto-imolação, em geral eu mando bem comigo.
Ir à praia sozinha, num lugar tranqüilo: isso é o paraíso. Ninguém reparando em você e na sua indumentária, ninguém contando suas celulites e dobras na barriga, ninguém na frente do seu sol. É só você, Deus, a areia, o mar. Isso para mim é meditar. Não que eu saiba realmente meditar: eu paro, respiro e dou uma viajada. Fácil. É só não ter nenhum ser humano carente de atenção nas redondezas. Porque senão meus planos vão por água abaixo: tenho esse vício de dar atenção às pessoas.
Hoje a minha solidão está muito bem acompanhada por um cara charmosão que até hoje se lamenta de não ter me conhecido. Vinícius morreu quando eu tinha dois anos de idade. Ele sabia o que era ser romântico. Duvido que alguém escreva as palavras coração, mulher, flor e lua tantas vezes quanto ele sem cair na pieguice. Um homem que, às vésperas de uma guerra mundial, escreve o Soneto da Fidelidade para sua amada é um homem que merece fazer parte de meu momento eremita e ser minha única ligação com o mundo dos terráqueos, esses seres estranhos.
É por isso que, num instante como esse, de vacuidade e sono, muito sono de alma cansada por não ter certeza de quase nada, ele me acompanha, me convencendo de que é melhor ser alegre que ser triste, me embalando na valsa para o ausente, insistindo que a mulher amada determina os meridianos e me pedindo que seja sua namorada.
E assim, sozinha, mas com Deus e ouvindo Vinícius: eu me basto.

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