Gracias, Pedro
O mais tocante no filme "Fale com ela" é a opção clara sobre um tema comum, mas raramente tão bem abordado: a incondicionalidade do amor. A pureza de sentimento é revelada em pequenas narrativas que se condensam na história de uma amizade. O protagonista, o amor que é o mesmo entre amigos, amantes, filhos: amor puro e simples, incluído ou não o desejo sexual . Os detalhes, os diálogos despretensiosos, a riqueza de pequenas metáforas sobre grandes coisas fazem o filme agradável mesmo às almas mais toscas. A força da valente toureira que, por fim, é fraca; a sensibilidade de um homem – um jornalista – que se afeiçoa a um rapaz problemático são alguns dos caminhos tortos que levam Marco ao que parece ser o verdadeiro amor que ele é destinado a viver. Já Benigno, rapaz ingênuo, encontra remédio para a solidão nos cuidados com a mãe e com a mulher por quem nutre um amor platônico e desesperado. A improvável amizade entre Marco e Benigno é o paroxismo da pureza: a ausência de malícia faz crer que, apesar da própria vida, viver é sencillo - mesmo que, segundo uma das personagens, nada seja “sencillo”. Fica a certeza de que a verdadeira solidão só pode ser sentida quando não há, por perto, ao menos conhecidos que uma desgraça qualquer possa tornar amigos. Simultaneamente sereno e inquieto, "Fale com ela" ensina sobre o amor incondicional, aquele que não espera resposta. É como amar alguém em coma, um corpo vivo sem o artifício da vida. É “falar com ela”, mesmo que ela não te ouça.
E tome Caetano Veloso e sua “cucurrucucu Paloma” que "arrepia os pêlos" do traseiro de Marco, além de uma reverência a Tom Jobim em declaração e em música com voz de Elis Regina no início do filme. Não dá pra não gostar, mesmo que a gente saiba que vai ter que agourar durante a estúpida festa do Oscar, ano que vem, para vermos o nosso “Cidade de Deus” brilhar em nome de todas as produções nacionais nunca reconhecidas na Terra Santa da Califórnia.