terça-feira, fevereiro 21, 2006

Meu encontro com Bono Vox

Fim do ano de 2000. Eu era estagiária. Pedi (ou quase implorei) para a chefe me credenciar para a coletiva de imprensa do U2, que estava no Brasil para divulgar o álbum "All that you can't leave behind" e fazer um showcase para meia dúzia de metidos a besta convidados do Fantástico. Primeiro, fui receber a banda no aeroporto. Eles chegaram pelo outro lado, driblando imprensa e fãs. Fiz uma materinha boba com os alucinados que os esperavam vestidos de U2 da cabeça aos pés, com as meninas do fã-clube que pintaram "U2" nas unhas e se tatuaram, com o perdido que deixou o cabelo crescer, fez um penteado estilo Bono e comprou óculos coloridos iguais aos dele. Dia seguinte, fico sabendo que fui credenciada como fotógrafa, já que o mestre underground Nervoso era nosso repórter oficial de cultura.

Chegamos ao Copacabana Palace. Eu dizendo sou fã, mas não sou tiete, e pensando que tinha a obrigação moral de perguntar alguma coisa na coletiva, qualquer coisa. Mas não fazia idéia do que seria. E estava tensa, sei lá por quê.

Conseguimos sentar mais ou menos na quinta fila do auditório. Subi no palquinho onde eles sentariam e posicionei meu gravador debaixo da boca imaginária de Bono Vox. E parti com minha Mavica, na época ainda uma boa câmera digital, hoje um trambolho ridículo. Quando entrei na salinha, aquele bando de fotógrafos se amontoava em um espaço mínimo, em cima de uma espécie de palanque. Na frente, uma placa de madeira com fundo branco. Eu, grande e de salto, não podia dar um passo à frente sem que aquele enxame reclamasse: "Quem é grande fica atrás!!" Fiquei no meio, encolhidinha. Então anunciaram que eles vinham aí. Bono foi o primeiro a entrar, de preto, sempre, e fazendo um "V" com os dedos da mão direita. Dave Evans, vulgo The Edge, meio tímido, sorridente. Larry Mullen com aquele ar blasé de quem sabe que já nasceu cool. Adam Clayton, a essa altura, confesso, nem consegui perceber.

Eles começaram a fazer aquelas poses: Bono chutando o ar, agachando, The Edge cruzando os braços, Larry jogando na nossa cara o ar de sou foda. Os fotógrafos frenéticos pediam Bono, olha pra cá!, hey Bono!, please smile, The Edge! etc. E sacudiam tanto que metade das minhas fotos ficou tremida. Até que Bono Vox veio andando até nós e pegou a câmera de uma baixinha que estava na frente. Excuse me, e começou a tirar fotos do bando de patetas que estavam lá para tirar fotos dele. Devolveu a câmera à moça, que não sei se ficou feliz por ter sido a escolhida, ou p. da vida por ter perdido fotos que todos teriam.
E eles saíram. E saí eu, correndo para pegá-los a tempo no salão da coletiva. Afinal, todos aqueles fotógrafos podiam ser profissionais e coisa e tal, mas nem todos tinham conseguido duas pulseiras: uma de acesso à area de fotos, outra à da entrevista. Uhuuuuu.

Sentei ao lado do André Nervoso, logo na primeira cadeira no corredor. Contei para o meu pacientíssimo companheiro que tinha acabado de ver o U2 a três metros de distância! Uau! Alguns minutos depois, eles entraram pela lado direito do palco. Foram andando vagarosamente, os repórteres de pé, sabe-se lá se por reverência ou porque se esqueceram de sentar. Então aconteceu. O Boa Voz andou até o meio do palco, mas, em vez de subir e se sentar, virou para o "público" e veio andando. Cumprimentou o pessoal da primeira fileira, How are you doing, ou apenas sorrindo. Quando chegou à quarta fileira da direita, me veio aquele frio na barriga. Gente, ele vai apertar a minha mão! Foi um pouquinho além. Paul Hewson me olhou, dobrou um pouco os joelhos e se abaixou, como as mulheres fazem no meio da quadrilha em festa junina, ou como faziam as damas vitorianas. Um segundo depois ali estava Mr. Paul Hewson pegando na minha mão, e não a apertando como se fosse a de um homem, mas fazendo menção de beijá-la. Chegou bem perto, e, confesso, não consigo lembrar se ele realmente beijou ou se apenas encostou nela. Eu estava em transe. Ele soltou minha mão, sorriu e voltou para o palco. Sentou-se e por acaso mexeu no meu gravador, como se o ajeitasse. Eu não acreditava. E ao mesmo tempo me sentia absolutamente grotesca por ficar tão atônita ao receber um beijo na mão, ou semi-beijo, e uma leve reverência de um cara, que, no final das contas, era só um cara que teve a sorte de ser bom no que faz e ficar famoso. Um ser humano quase como outro qualquer. Quase.

Durante a entrevista, o André me fez levantar a mão para fazer uma pergunta. Eu não tinha idéia do que dizer. Que se dane o jornalismo, eu quero é ir ao show. Tudo o que eu pensava era "Mr. Hewson, would you mind singing In a little while whispering in my ears?", mas achei que não ia pegar bem. Infelizmente, ou graças a Deus, minha vez não chegou (todo mundo queria ser ouvido por Bono Vox) e eu baixei a mão de fininho, sob olhares de protesto do impassível Nervoso, que também não teve vez. Para compensar, a última pergunta foi concedida a um jornalista argentino: "Maradona ou Pelé?", indagou o cidadão. "The best is George Best", mandou o diplomático e simpático The Edge. Risos. Fim.

Quando achei que minha aventurinha havia terminado, outra pequena surpresa. No dia seguinte, tive que ficar de plantão na porta do hotel - por motivos de trabalho, óbvio... Rolava uma história de que eles gravariam um clipe no Rio. Boato confirmado: lá estava o U2, primeiro no terraço, depois na varanda do Copacabana Palace, logo ali, no primeiro andar, com câmeras e poses de videoclipe. Bono cantou um refrão de algo que não era uma música deles, a galera repetiu, enquanto a câmera filmava os fãs e também nos enquadrava, nós, os coadjuvantes jornalistas. Todo mundo crente que ia aparecer de figuração no clipe do U2. Passou um tempo, eles desceram e entraram em uma van na porta do hotel. Eu estava bem perto da janela, e, obviamente, fiquei olhando lá para dentro. Até que ele, meu amigo Paul Hewson, olhou para mim e cutucou The Edge, que sorriu. Larry estava atrás, em seu mundo particular e perfeito, e Adam, mais uma vez, passou desapercebido. Mr. Paul deu então um tchauzinho, tapou a boca com a mão e me mandou um beijo. Achei que não era comigo, olhei para o lado, mas era comigo sim, não era possível...Ri, eles riram, e a van partiu, bem devagar. Eles não olharam de novo, aí já seria demais, e tudo voltou ao normal: U2 lá no estrelato, eu aqui no anonimato. Abestalhada e anônima.

Ao contrário daquela presidente do fã-clube, a menina que tatuou U2 no braço e pintou as unhas, não consegui ir ao showcase. Não apareci no clipe de Walk on. Não fui ao catártico show de ontem, e claro que não estou no Morumbi nesse momento, escrevendo no meu laptop. Mas ainda vou a um show deles, tenho certeza.

Moral da história: Katilce uma ova, eu sou mais eu!

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