segunda-feira, junho 30, 2003

O que me assusta

Vivo aqui na minha mitocôndria azul e amarela, com meus poucos ribossomos e nenhuma idéia de como tornará à terra meu DNA. Mas isso pouco me importa: assim como todos, vivo como se fosse imortal. Alguém ainda se agonia mais com a morte do que com a vida? O que, enfim, te assusta?

Afora os medinhos de mulherzinha, me assustam perder a saúde e não encontrar emprego. Sofrer um acidente, perder uma perna, ficar cega, ter o rosto queimado, essas tragédias de que não estamos livres. Me assusta ficar tetraplégica. Me assusta preferir morrer a virar um vegetal pensante. Me assusta, também, que algo assim suceda a qualquer pessoa que eu amo.

A fila de candidatos a reserva de gari me assusta horrores. Tenho medo de me formar, preencher “jornalista” em formulários, mas não conseguir um emprego legal. Me assusta querer ter filhos, mas não tê-los por medo de não poder sustentá-los.
Tudo isso me assusta mais do que a violência no Rio de Janeiro.

Não tenho medo de ficar velha, nem de definhar sozinha ou de não ter amigos. Por incrível que pareça, não tenho mais aquele medo irracional de perder as pessoas que amo. Já sofri perdas, já chorei – e ainda choro - de aperto, de saudade, de inconformismo. Mas isso tudo é previsível e não depende de nós. Já a busca terrível e constante por algo que te ocupe pelo menos oito horas diárias, que não te deixe miserável e dê para sustentar uma casinha – isso sim me assusta. Menos do que a perda de saúde, mas, ainda assim, me assombra.

Mas tudo o que me assusta só o faz porque sou egocêntrica e vivo na ilusão da razão. Adoro viver e tenho medo da dor, mas não da morte, que pode até ser reconfortante – não a morte em si, mas o pensar nela. A morte é o único acontecimento de que não podemos fugir, a única certeza na vida. Porque, no final das contas, não há nada de novo debaixo do sol: é tudo vaidade e vento que passa.

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